33 mil refugiados vivem abaixo da linha da pobreza em Manaus

 

Por Lucas dos Santos acritica.com

A Agência da Organização das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) revelou com exclusividade para A CRÍTICA que pelo menos 33 mil refugiados na cidade de Manaus vivem abaixo da linha da pobreza. A grande maioria é formada por venezuelanos, incluindo aqueles com diploma de ensino superior, mas que acabam trabalhando na informalidade ao chegar no país. Desde 2018, mais de 148 mil refugiados deixaram a Venezuela em direção ao Brasil, com mais de 100 mil registros de documentação sendo feitos no estado do Amazonas.

O representante da instituição no Brasil, Davide Torzilli, e a chefe do escritório em Manaus, Laura Lima, relembraram que na última semana o Ministério da Justiça, o Observatório das Migrações Internacionais (ObMigra) e ACNUR divulgaram um relatório mostrando que o Amazonas foi o segundo maior destino das solicitações de refugiados da região Norte, abaixo somente de Roraima, principal porta de entrada dos imigrantes venezuelanos.

“A região amazônica do Brasil é claramente, por ser fronteira com a Venezuela, a região que representa o fluxo mais importante do país. Realmente, a região tem recebido o número mais alto de solicitações de refugiados no ano passado, 34% do total”, disse Davide Torzilli.

De acordo com os dados produzidos pela Prefeitura de Manaus – especificamente a Secretaria Municipal da Mulher, Assistência Social e Cidadania (Semasc) – há 44,8 mil pessoas não nacionais inscritas no CadÚnico, as quais sofrem com algum tipo de vulnerabilidade social. Nessa categoria, a maioria são venezuelanos (42.527), mas também engloba outras nacionalidades.

Laura Lima ressaltou que o Amazonas possui um contexto bastante complexo, mas muito fluido, já tendo lidado com a questão imigratória de colombianos e haitianos na última década.

“É um Estado que está acostumado e já tem alguns mecanismos para poder receber as pessoas e assegurar que elas tenham a proteção mínima, as quais elas têm direito, mas como mesmo as pessoas brasileiras do Amazonas enfrentam dificuldades para acessar seus direitos, as pessoas refugiadas enfrentam muitas vezes as mesmas [dificuldades]”, disse.

Mercado de trabalho

A inserção dos refugiados no mercado de trabalho é outro ponto de atenção da ANCNUR. Davide Torzilli destacou que o Brasil possui uma política muito acolhedora com imigrantes com necessidade de proteção internacional e tem “uma legislação muito avançada que permite a qualquer refugiado solicitante de ter acesso a todo serviço e também ter acesso a trabalhar”.

“É extremamente importante, porque você, como refugiado de qualquer nacionalidade, chega ao Brasil e você pode, se você tem a capacidade, encontrar um trabalho, até um trabalho formal. Por exemplo, dados do Ministério do Trabalho indicam que mais de 140 mil venezuelanos estão registrados no mercado formal de trabalho”, disse.
Davide Torzilli, Representante do ACNUR no Brasil

Davide Torzilli, Representante do ACNUR no Brasil

Laura Lima informou que a ACNUR mantém uma forte parceria com as empresas privadas para informar aos refugiados de oportunidades de trabalho legais, estabelecendo parcerias para fomentar o emprego e o empreendedorismo, a exemplo da associação Hermanitos, que tem “pessoas daqui que conhecem o contexto daqui que tem todo o interesse de desenvolver o estado e criar uma riqueza para toda a sociedade”.

“Eles fazem, junto conosco, todo um processo de identificação dessas pessoas, que já têm estudos e que o que precisam, muitas vezes, é prender português ou ter um Uber para chegar na entrevista de trabalho. Então, aqui o trabalho é muito de mitigação de barreiras para permitir que elas possam se empregar. Mas isso é um fluxo ainda de formiguinha, porque a gente precisa do interesse das empresas”, destacou.

Há ainda um trabalho conjunto ao Ministério Público do Trabalho (MPT) para fiscalizar e garantir que os refugiados não sejam vítimas de exploração de mão de obra. A Operação Acolhida, do governo federal, também realiza o trabalho de checagem nas empresas para verificar o recebimento correto dos imigrantes.

Laura Lima, Chefe do Escritório do ACNUR em Manaus

Laura Lima, Chefe do Escritório do ACNUR em Manaus

Obstáculo da língua

Questionado sobre quais eram as principais dificuldades dos refugiados que chegam ao Brasil ainda hoje, Davide Torzilli apontou duas: a questão do idioma e a validade dos diplomas de ensino superior, que precisam ser novamente avaliados pelos entes educacionais do país.

“A nível do Brasil, mas também aqui na Amazônia, seguramente o idioma é o primeiro obstáculo. Essa é uma das grandes prioridades da ACNUR com o nosso parceiro de oferecer, trabalhar com o Sistema S, por exemplo, de acesso ao curso de português. Isso é fundamental para ter acesso a um trabalho, para se integrar na sociedade brasileira”, disse.

Sobre o reconhecimento dos diplomas estrangeiros, a ACNUR possui uma forte parceria com a rede de universidades Cátedra Sérgio Vieira de Melo, da qual faz parte a Universidade Federal do Amazonas (Ufam) desde 2022, para trabalhar a revalidação e o apoio a pessoas refugiadas.

“Hoje, se vocês vão no PAC [Pronto Atendimento ao Cidadão], a gente tem um projeto com a Ufam precisamente onde os estudantes de direito estão fazendo as práticas obrigatórias deles dando apoio jurídico aos refugiados no PAC. Então, literalmente, os futuros advogados, procuradores, defensores do Estado já estão tendo esse trabalho direto coma população”, explicou Laura.

Evento em Manaus

A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) realiza, na nesta terça-feira (17/06), um evento especial no marco do Dia Mundial do Refugiado, com o tema “Resiliência Climática e Inclusão Socioeconômica”. Contanto com a presença de autoridades públicas nacionais e internacionais, representantes do setor privado, organizações da sociedade civil e de pessoas refugiadas, o evento será realizado das 9h às 12h30, no Auditório Floriano Pacheco (SUFRAMA), em Manaus.

Davide Torzilli informou que, no evento, será lançado um hub do Fórum Empresas com Refugiados em Manaus. A iniciativa reúne mais de 140 empresas e organizações que atuam com pessoas refugiadas dando emprego, capacitação e qualificação profissional. O objetivo é incentivar empresas locais para se engajar “na pauta do refúgio” e dar oportunidade às pessoas refugiadas na cidade de Manaus.

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Libia López Jornalismo-Repórter News working in Brasil

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